“Eu só quis ajudar”- Essa é uma frase típica de quem meteu os pés pelas mãos ou exagerou ao ajudar alguém a fazer o que, na verdade não queria. Como o velho ditado diz: de boas intenções o inferno está cheio, assim está grande parte da liderança de grupos religiosos e, porque não dizer, empresas e associações.
Podemos dizer, em alguns casos que o motivo seja por excesso de generosidade, quando a pessoa deseja consertar o mundo ou o ambiente em volta. Em outros casos, quiçá a maioria deles, seja o controle excessivo, digo isso mesmo sabendo que é muito difícil alguém se declarar um controlador contumaz que não só manipula como é capaz de articular e manobrar a grosso modo pra que a sua vontade seja feita.
Para isso as falas consistem em: “vai ser melhor assim” ou “que bom que será prá você”, ignorando por completo os sonhos, anseios e desejos e até possibilidades da pessoa envolvida.
Bom, como corriqueiramente acontece, a pessoa não quer, ou desiste ou em casos mais graves se machuca seriamente dentro do “plano perfeito imposto” e aí saem de cena, mudando de empresa, dizendo para o líder que não era bem isso que esperava e então é a hora de vitimizarmo-nos ou encarar o problema como sendo culpa de quem não se adaptou ao projeto alheio.
Na Bíblia há um episódio parecido com este, com muitas lições e com um desfecho muito mais sério: trata-se da história de Uzá que conduzindo um carro de boi que levava a Arca da Aliança, que significava a presença de Deus, quis impedir a Arca de cair do carro, uma vez que os bois haviam tropeçado, e morreu instantaneamente.
Uzá sabia que a Arca não podia ser tocada, mas impensavelmente, por querer ajudar a manter a Arca encima dos carros de bois, morreu sem ao menos ter tempo de se arrepender.
Ao longo da história, líder é aquele que não deixa a peteca cair em nenhuma circunstância, e na ânsia de produzir, prosperar, mostrar serviço, competir e manter o status quo, acabam por se fazer o inesperado, proibido e incapaz para um ser humano: paramos o carro, seguramos a Arca, resolvemos problemas dos outros, estouramos balões, jogamos confetes, ficamos à frente da bola de neve e somos atropelados por uma avalanche! Podendo-se perder a família, a saúde, a alegria e até o foco!
Esmorecemos. Ficamos abatidos e a viagem precisa parar.
A história nos conta que anos depois a viagem é retomada, sem colocar a Arca em cima de carros, mas sendo levada de acordo com as ordens de Deus, ou seja, sem expor ninguém ao risco de morte ou de se ferir.
Se nos esquecemos dos riscos, e, receando parar o cortejo ultrapassamos os limites é hora de parar e traçar um novo plano de viagem. A vida de pessoas é muito importante, respeitar suas origens e desejos é respeitar a nós mesmos, impondo-nos limites para não destruirmos aos outros e a nós mesmos.
Outra lição que fica é a de que não somos insubstituíveis: a história de volta da Arca para Jerusalém continuou, dessa vez, da forma correta e sem a presença de Uzá.
Termos certeza de que estamos no lugar certo também nos ajuda a olhar para o outro como senhor da própria história, assim como nós, e se em algum momento a vida dele ficou paralisada, é preciso respeitar o momento e não se precipitar a segurar a Arca, isso pode nos custar o lugar de liderança, a amizade, o companheirismo e o respeito.
Há momentos que a peteca vai cair e precisamos deixá-la, na liderança haverá muitos recomeços, pois, os mesmos fazem parte da história. E, se estamos chorando a pausa da viagem ansiosos para um imediato recomeço, precisamos aprender com a espera. Como há um tempo atrás, ouvi de uma pessoa sábia: “às vezes a música precisa ter suas pausas para voltar ainda mais plena, isso faz dela ainda mais bela e deliciosa”. Respeitemos as pausas da vida, elas fazem parte de um plano maior que embeleza nosso viver, nos faz serenos, e a cumprir o propósito de Deus sem agitação, sem controle e com mais sabedoria.